Ex-diarista conta história de superação após ingressar na unidade que atende crianças, adolescentes e adultos, divididos entre cegos, pessoas com baixa visão e com deficiência múltipla
Enxergar a vida de uma nova maneira, buscando ajuda e exercendo o ato da gratidão. Esse foi o caminho que Anália Vidal, de 54 anos, encontrou para superar as dificuldades impostas pela cegueira total adquirida quando tinha 33 anos. Aluna da Escola Municipal Especializada Dr. Hilton Rocha, da Secretaria Municipal de Educação (SME) de Volta Redonda, a ex-diarista se diz grata pelo apoio e acolhimento recebidos da unidade escolar, e conta um pouco sobre sua trajetória após receber o diagnóstico de diabetes mellitus não especificado e retinopatia diabética, que acabaram provocando a cegueira.
“Eu era muito materialista, não seguia recomendações médicas, acabava comendo alimentos que poderiam prejudicar minha saúde, pegava peso não adequado, contrariando as orientações da oftalmologista. Em uma noite, me deitei enxergando e no dia seguinte acordei cega”, relata Anália, que acabou desenvolvendo um quadro depressivo, já que não conseguia mais fazer a maior parte das atividades rotineiras.
Entre diversas situações de dificuldades do dia a dia, uma amiga apareceu em sua casa comentando sobre a Escola Hilton Rocha, e Anália, mesmo um pouco relutante – por conta da depressão e situações delicadas vividas –, decidiu conhecer a unidade, que atualmente funciona em um espaço da prefeitura localizado no bairro Aterrado enquanto a nova unidade está sendo erguida no Voldac.
Em seu primeiro dia, quando perguntada sobre seus planos e projetos, Anália comentou que não tinha, e assim foi durante o questionário respondido à equipe da escola. Foi então que a primeira oportunidade apareceu, com Anália descobrindo que poderia concluir os estudos.
“Eu não acreditava, por estar cega, mas voltei para os estudos. Iniciou-se aí outro grande problema: ‘como eu iria sair de casa’? Então comecei a participar das aulas de Orientação e Mobilidade na escola”, conta Anália, ressaltando que os primeiros meses ainda foram difíceis para superar toda a tristeza provocada pela cegueira e suas consequências.
Novos passos em busca da autonomia
E foi na própria Escola Hilton Rocha, que atualmente atende 83 alunos, divididos entre estudantes cegos, com baixa visão e deficiência múltipla (deficiência visual associada a outras deficiências), que Anália encontrou exemplos que inspiraram sua transformação.
“Comecei a perceber que minhas amigas saíam sozinhas, iam para o ponto de ônibus por conta própria, enquanto meu marido me levava para a escola. Nesse período tive o apoio da escola, a professora foi à minha casa, me ensinou como devo entrar e sair de um ônibus. Fui adquirindo autonomia, aprendi a sair sozinha, e hoje viajo para vários lugares, como Guarapari, no Espírito Santo, e até já utilizei metrô”, conta, animada.
Essa autonomia é destacada pela diretora da Escola Municipal Especializada Dr. Hilton Rocha, Vera Lúcia Ferreira Cruz. Ela ressalta que a unidade prioriza o desenvolvimento integral dos estudantes com deficiência visual – destacando a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que estabelece direitos fundamentais para a inclusão e autonomia das pessoas com deficiência, incluindo aquelas com deficiência visual.
“Isso nos faz reforçar a importância de uma educação inclusiva e especializada que promova a autonomia das pessoas com deficiência em atividades de vida diária, garantindo-lhes o máximo de independência possível. Proporcionar o desenvolvimento de autonomia em atividades de vida diária é fundamental e inclui habilidades como mobilidade, autogestão e realização de tarefas práticas”, explica Vera.
Com o desafio da mobilidade sendo superado, outro ponto incomodava Anália: o cuidado com a própria casa. Mais uma vez a ajuda apareceu na unidade escolar especializada. Ela conta que um casal de amigos, também cegos – um instrutor de Artes e outra aluna da Hilton Rocha –, viviam juntos há anos com total independência, inclusive tendo filhos.
“Eles cozinhavam, arrumavam a casa, faziam compras com autonomia, e isso me inspirou e me fez acreditar que era possível. Para quem não tinha celular, não sabia nem fazer uma ligação, hoje eu pago os meus boletos no aplicativo, sei conferir o saldo e consigo realizar outras atividades no celular. Depois que me encontrei como pessoa que perdeu a visão, mas recuperou a vida com o apoio da Escola Hilton Rocha, procuro ajudar a todos os estudantes com cegueira e baixa visão que conheço, seja na escola ou fora dela”, diz Anália, que atualmente faz aulas de Rádio Teatro, Leituras e Reflexões, Artesanato, Jardinagem e Tecnologia Assistiva – todas ministradas na unidade da rede municipal.
Espaço atende crianças, adolescentes e adultos
A Escola Municipal Especializada Dr. Hilton Rocha atende a estudantes oriundos das escolas da Rede Municipal de Ensino de Volta Redonda e de municípios vizinhos, estudantes de escolas particulares e da comunidade. A unidade possui alunos matriculados divididos entre crianças, adolescentes e adultos, com Atendimento Educacional Especializado (AEE) no contraturno, além de reabilitar as pessoas que perderam ou estão em processo de perda da visão.
Com uma equipe de profissionais especialistas na temática da deficiência visual, incluindo aqueles que são capacitados quando chegam à escola, a Hilton Rocha oferta atendimentos como Apoio de Ensino, no qual os estudantes são atendidos no horário inverso da escola regular, Musicalização, Orientação e Mobilidade, Programa Especializado Alternativo (PEA), Estimulação Visual, Assinatura, Educação Física, Práticas Educativas para uma Vida Independente (Pevi), Radio Teatro, Braille, Sorobã (espécie de ábaco adaptado para deficientes visuais), Tecnologia Assistiva, Estimulação Visual e Projeto Jardim Sensorial.
“A Escola Municipal Especializada Dr. Hilton Rocha tem um papel de fundamental importância no desenvolvimento dos alunos cegos ou com baixa visão, uma vez que oferece atividades específicas que estimulam a percepção motora, tátil e auditiva, para compensar o comprometimento visual. Os professores utilizam recursos que garantem o aprendizado e favorecem a inclusão, tanto na escola regular quanto na vida em sociedade, de forma que os alunos utilizem a escrita pelo Braille, usando a punção e a reglete para escrita; e sorobã, que auxilia nos cálculos matemáticos, entre outros recursos específicos para esse público”, explica Elisabeth Melo, que é coordenadora da Seção de Educação Especial da SME.
Toda essa estrutura é elogiada por Anália, que é grata pelo atendimento recebido. “Posso dizer que foi muito difícil vencer tudo isso, uma situação horrível, sensação de que você entra em um buraco sem possibilidade de sair dele, mas quando supera, você venceu, pode levantar, sacudir a poeira, e agradecer a Deus e à Escola Especializada para pessoas com Deficiência Visual que tem na nossa cidade”.
A história de Anália Vidal é mais uma da série “Gratidão Não Prescreve”, da Prefeitura de Volta Redonda, que vem apresentando relatos de pessoas gratas ao atendimento recebido em momentos que precisaram de algum serviço público municipal.
Nova escola contará com Jardim Sensorial
E a Secretaria Municipal de Educação está investindo para melhorar ainda mais o trabalho desenvolvido na escola especializada. A nova unidade, que está sendo erguida no bairro Voldac, prevê três andares, sendo que os dois primeiros terão salas de estar, de estimulação precoce e visual, avaliação, informática, música, alfabetização, apoio e da Direção e Secretaria. O prédio contará também com refeitório, banheiros para funcionários e alunos (incluindo acessibilidade), elevador, cozinha, despensa, depósito, auditório e biblioteca, entre outras áreas.
No terceiro pavimento será criado um Jardim Sensorial. O espaço, segundo a seção de Educação Especial da Secretaria Municipal de Educação (SME), será destinado para trabalhar a exploração sensorial, oferecendo aos estudantes a oportunidade de explorar diferentes texturas, cheiros e sabores de diversas partes das plantas. O terceiro andar terá ainda outros espaços, como área de fisioterapia, de circulação, além de depósitos e banheiro com acessibilidade.
“Assim como estamos reformando outras unidades da rede municipal, também buscamos melhorar cada vez mais as estruturas, os espaços das escolas especializadas, e o novo prédio da Hilton Rocha será fundamental para proporcionar mais conforto, comodidade e oferecer um espaço mais moderno e acolhedor para alunos e profissionais”, afirmou o secretário municipal de Educação, Osvaldir Denadai.
Foto de Cris Oliveira – Secom/PMVR.